sábado, 10 de abril de 2010

A Herança de um Shaman VIII

– E onde fica Tardos, então?
Novamente Genim me olhou com uma expressão de surpresa. Parecia que eu era alguma espécie de criatura que ele não conseguia entender. Ainda assim, ele limitou-se a responder secamente:
– Tardos é uma cidade ao noroeste daqui. Lá encontrará Nick, uma experiente Shaman. Ela te ensinará como usar seus poderes. Tens mais alguma pergunta?
A noite estava avançando rapidamente, e o vinho que bebia começava a fazer seu efeito. Os olhos começavam a embaçar, e as coisas não faziam mais tanto sentido.
Uma forte corrente de vento tomou a campina, enquanto Genim abria um franco sorriso. Eu senti uma nova presença surgindo atrás da pequena morte. As sombras foram aos poucos se adensando, até tomarem a forma de uma pequena criança, em quase tudo idêntica a Genim. Somente seus cabelos e olhos em tons cálidos de dourado o distinguiam.
– Oirim.
O Sono. Ele não falou, apenas meneou positivamente a cabeça. Sua presença era mais calorosa que a de seu igual, fazendo com que meus músculos aos poucos relaxassem.
– Está na hora, meu irmão. Ele precisa descansar, até que o sol nasça novamente, e ele precise caminhar.
– Eu sei. Acontece que já fiz isso tantas vezes que me sinto um pouco atraído por este serviço. Eu sei que é mórbido, mas creio que ninguém melhor que a morte para esta função. – Ele sorriu maliciosamente.
– Descanse, jovem. A manhã virá em breve, e com ela deverás partir para a cidade dos muros. Uma raposa lhe avisará sobre teu caminho.
Não me lembro de nada mais que me fora dito. Uma sensação de conforto e bem estar tomou meu corpo, e antes que qualquer palavra pudesse ser proferida, caí no sono.

Oirim olhou secamente para o irmão.
– Achas que ele tem futuro?
– Talvez. Eu vejo um futuro brilhante, mas cheio de agruras. Ele será grande, maior que seu pai, porém enfrentará perigos muito maiores.
– Será ele que trará a guerra?
Aeon caminhava resoluto, em toda a sua glória.
– Não posso afirmar nada. No entanto, tenho certeza que ele terá seu papel nos próximos acontecimentos.
– Somente o tempo poderá dizer. – Oirim falava sonhador, olhando para o céu. – As estrelas estão diferentes hoje. Nebulosas e estranhamente silentes. Creio que chegamos a um novo começo.
– É também um novo final. – falou Genim, contido. – O tempo é o senhor das coisas, dê a ele a chance de mostrar seus desígnios. – Os três sumiram no ar, como uma nuvem afastada pelo vento.
Na manhã seguinte, Andrey colocou seus pertences sobre o ombro, e seguiu uma pequena raposa, que o levava para a ravina que marcava os confins de sua cidade. Ele nunca mais voltaria a sua terra natal.
Segundo muitos historiadores de Eridor, este é o primeiro evento a desempenhar papel relevante no ocaso da Terceira Era.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

A Herança de um Shaman VII

– Essa história é longa. O que sabes sobre os quatro generais?
Pensei e reuni as poucas informações que tinha. Nunca tinha estudado história, e tudo aquilo que eu sabia era aquilo que meu pai havia contado nos anos passados.
– Tudo que eu sei é que eles eram os quatro Espíritos encarregados pelo Poder das Trevas de cuidar das facções de seu exército. Eram o Terror, a Peste, a Discórdia e a Destruição. Em algum ponto da Segunda Era, eles foram aprisionados. Isso era o que eu sabia até agora.
– Por incrível que pareça isso é bastante coisa. Bem, vamos à parte que interessa. No final da Segunda Era, um poderoso necromante apareceu na cidade de Liath. Consigo, ele trazia um segredo que mudou as chances a nosso favor, na batalha contra o Elemental das Trevas. As almas que estão dentro dele foram as primeiras a criar um cristal de almas, e foi com essa arma que quatro poderosos magos venceram os Espíritos. Eram quatro humanos, que encerraram os generais dentro de si.
– Estás me dizendo que humanos chegaram tão longe?
– Exatamente. Os Espíritos que lutavam ao nosso lado, por óbvio, os ajudaram nessa empreitada. Eu mesmo ajudei o teu antepassado no momento do embate.
Eu pensei por um minuto. Então eles vencerão os quatro generais e os submeteram aos seus poderes. Certo, se os Espíritos haviam ajudado isto me parecia mais plausível. Mas algumas coisas ainda pareciam me incomodar no meu íntimo.
– Disseste que, além de nós quatro, havia outros Shamans no mundo, que Espíritos eles prendem?
Genim olhou-me com olhar de quem não acreditava no que ouvia. Por alguns momentos ficou parado me olhando, medindo as palavras.
– Eles não prendem nenhum espírito. São comunhões de comum acordo entre Espíritos e humanos ou elfos. Isso acontece, por exemplo, quando o Espírito é muito fraco, ou sua origem de poder está sendo destruída, e ele está próximo à morte. Esses Shamans, em regra, são muito mais fracos do que vocês, os quatro grandes Shamans, mas é com um deles que treinarás.
– Certo. O que acontece quando um Shaman é morto?
– Simplificando, o Espírito que ele prendia é liberto.
– Isso significa que…
– Se morreres antes de transferir este espírito ao teu sucessor, tudo estará acabado. – Ele falava com uma certeza inconveniente. – Por esta razão, nem penses em morrer antes que eu volte a vê-lo.
Calei-me. Era bastante saber que eu deveria ir atrás de treinamento, e sobreviver ainda assim.
– E para que eu preciso treinar?
– Para que este Espírito dentro de ti não tome a tua consciência, para que saibas controlá-lo. Isto seria o principal. Mas por algum azar que as estrelas guardam para os Shamans, vocês sempre acabam tomando um papel central em seu tempo. Mas não te preocupa, pois os pequenos Espíritos de raposa serão fieis emissários nesta tua jornada.
Uma pequena raposa apareceu ao nosso lado. Já havia visto uma, só não me lembrava aonde. Passei a mão na cabeça daquele pequeno ser, enquanto pensava na próxima pergunta.